Economia

AMPLIAÇÃO DA IDADE LIMITE NO BRADESCO JOGA HOLOFOTE EM SUCESSÃO DE GRANDES CIAS

A safra de executivos de grandes companhias de capital aberto se aproximando da idade limite imposta em estatuto, que no geral é de 65 anos, vem jogando luz sobre os processos de sucessão das corporações, que precisam sair à caça de substitutos. O tema ganha, neste momento, atenção redobrada, com a mudança anunciada ontem pelo Bradesco, de ampliar a idade limite. Antes, Itaú Unibanco já havia optado por esse caminho. Outras empresas buscam respaldo nos chamados head hunters para garimparem no mercado, ou em casa, nomes que se encaixem à posição, como fez a BM&FBovespa. No entanto, mesmo as empresas que não contam com essa limitação precisam encarar, em algum momento, a necessidade de troca de seu principal executivo.

Ocupar a presidência de uma companhia não é algo trivial e vai muito além de conhecimento técnico, destaca o sócio da Caldwell Partners, especializada em recrutamento de executivos, Arthur Vasconcellos. O profissional deve ter, conforme ele, perfil de articulador e diplomático ao mesmo tempo fora um conteúdo político. “A sucessão não é apenas identificar o profissional, mas ajustá-lo a uma cadeira que é difícil de ocupar”, afirma Vasconcellos.

Na prática são poucas empresas que têm limitação de idade no Estatuto. Além de Bradesco, Itaú e BM&FBovespa, a lista conta ainda com Itaúsa e Porto Seguro. A Bolsa incluiu esse item no estatuto na Assembleia Geral Extraordinária realizada do ano passado e justificou, na proposta da administração da companhia divulgado à época, que a mudança estava em “em linha com as melhores práticas de governança corporativa”.

No caso do Bradesco, pesou para a ampliação da idade limite a integração do HSBC em meio à crise no País e ainda eventos que não estavam no cronograma como o falecimento de Marco Antonio Rossi, presidente da Bradesco Seguros e vice-presidente do banco, em um trágico acidente de avião no ano passado, e desdobramentos na Zelotes, que apura suposto esquema de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Com a elevação, que passará de menos de 65 anos para menos de 67 anos, caso seja aprovada, Luiz Carlos Trabuco Cappi deverá ficar no comando do banco até meados de 2019, completando uma década à frente da instituição, mesmo período de seu antecessor, Márcio Cypriano.

Ao optar pela extensão de prazo, o Bradesco seguiu a mesma decisão já tomada pelo seu concorrente, o Itaú. Dois anos antes de Roberto Setubal, presidente executivo do banco, completar 60 anos, a instituição elevou a idade máxima para 62 anos para a sociedade, companhia aberta que controla todas as empresas do conglomerado. Fontes não descartam, porém, a possibilidade de o limite ser ampliado novamente. Um executivo diz que os comentários nesse sentido têm aumentado. “Não é impossível”, complementa outro.

Se nada mudar, Setubal deixa o cargo de executivo do banco no ano que vem e um dos diretores gerais deve substituí-lo: Candido Bracher, Marco Bonomi ou Marcio Schettini. O Itaú, procurado, disse que não há intenção de alterar o limite de idade. “Postergar a saída do executivo é muito ruim para uma grande companhia. Pode ser lida como autorreconhecimento de um grave problema”, diz um executivo de mercado, acrescentando que a postergação pode ainda lançar dúvidas se a empresa será capaz de indicar um nome para a substituição ao final do prazo estendido.

Outro caso de executivo próximo de 65 anos que chamou atenção foi na Vale. Mês passado, inclusive, a Justiça do Rio concedeu liminar proibindo que a assembleia geral extraordinária da Vale votasse a idade limite de 65 anos, após ação de acionistas minoritários.

Processo
Na BM&FBovespa, que aguarda aprovação dos órgãos reguladores para a fusão com a Cetip, o diretor-presidente da companhia, Edemir Pinto, se aproxima da idade limite do estatuto e o assunto já está no radar do Conselho de Administração da companhia, apurou o Broadcast. Uma fonte diz que os prazos para a substituição deverá ser definida já no último trimestre deste ano. O presidente da Cetip, Gilson Finkelsztain, é um dos principais cotados para ficar à frente da companhia fruto da fusão da depositária com a Bolsa.

A troca de bastão na Bolsa deve acontecer apenas após a conclusão da integração, que depende do sinal verde dos reguladores, sacramentando a união das companhias após seis tentativas anteriores. Isso se tornaria, assim, uma das marcas da gestão de Edemir, presidente da companhia desde 2008 e que esteve à frente de todo o processo de negociação para a fusão com a Cetip. A empresa responsável pelo processo é, de acordo com uma fonte, a Spencer Stuart, especializada em plano de sucessão de presidentes. Além de Finkelsztain, são cotados, apurou o Broadcast, o diretor executivo de Clearing e Depositária da BM&FBovespa, Cícero Vieira, José Berenguer, presidente do JPMorgan no Brasil e conselheiro da Bolsa, e ainda o do ex-presidente do HSBC no Brasil, André Brandão.

A BM&BFovespa afirmou que não existe neste momento qualquer decisão formal dos seus órgãos de administração a respeito da sucessão do diretor-presidente atrelada ao calendário das aprovações regulatórias da combinação de negócios proposta com a Cetip. A Bolsa esclareceu ainda, que o “atual mandato do diretor-presidente expirará em 30 de abril de 2017, sendo permitida a recondução nos termos do Estatuto Social, e que, alinhada às melhores práticas de governança corporativa, a empresa mantém uma política de sucessão mediante a qual avalia regularmente potenciais candidatos para os cargos chave de gestão da empresa em diversos níveis”.

Apesar de não haver idade limite imposta em estatuto, a varejista Lojas Renner foi outra que estendeu a presença seu presidente, José Galló, no comando. O Conselho aprovou em fevereiro a prorrogação do contrato de Galló na companhia por dois anos, a contar de 1º de janeiro de 2017. No ano passado, o contrato havia sido renovado até 2017, quando ele completa 65 anos, mas a possibilidade de prorrogação até 2019 já era prevista.

Numa companhia sem controlador definido, a imagem de Galló é frequentemente associada com a identidade de “dono” na Renner. Por conta disso, a empresa é recorrentemente questionada quanto ao futuro no que diz respeito à sucessão do executivo. Durante evento com investidores no ano passado, o presidente do Conselho de Administração da Lojas Renner, Osvaldo Schirmer, procurou afastar temores. Ele afirmou que a companhia está preparada “caso algo retire Galló do nosso convívio” e que já se definiu na Renner que o sucessor na presidência “está dentro de casa”.

No entanto, o processo de sucessão é uma questão a ser trabalhada em qualquer empresa, havendo idade limite ou não. Para o especialista em governança Renato Chaves, o assunto não deve estar no radar da empresa apenas no momento em que o seu principal executivo se aproxima da idade da aposentadoria, mas ser endereçado no seu dia a dia. Até porque, destaca, há situações em que o a companhia pode ser pega de surpresa, caso de falecimento ou até mesmo a saída do executivo. É importante, conforme ele, expor mais os executivos de dentro da casa para o Conselho, responsável pelo processo sucessório. “Muitas vezes, o Conselho não conhece todos os executivos. Ao conhecer, podem até mesmo sair da mesmice de escolher o diretor financeiro para ser o sucessor”, opina Chaves.

Em caso de empresas familiares, muitas vezes, o processo de sucessão costuma ser um calcanhar de Aquiles, mas é necessário para garantir a perenidade da empresa, afirma Antonio Araujo, do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Para ele, a inclusão de uma idade limite, estampada no estatuto da companhia, pode ser um instrumento interessante para trazer o assunto da sucessão para a pauta da empresa.

Posso ajudar?